Poesia



Vencedor do prêmio de melhor roteiro na edição do ano passado do festival de Cannes, o longa sul coreano Poesia é uma das mais belas e sensíveis produções cinematográficas dos últimos anos.

O filme - dirigido e roteirizado por Lee Chang-dong, se centra na história de uma velha mulher que tem como responsabilidades a criação do neto , deixado pela mãe com ela - bem como os cuidados com um paciente decrépito , como forma de ajudar no orçamento.

A vida de Yang Mija (Yoon Jeong-hee) muda drasticamente de rumo , quando o mistério envolvendo o assassinato de uma estudante bate à sua porta. Na verdade é este evento que faz o cursor narrativo se mover, através de uma cena poeticamente bela, despertando no espectador sensações estranhas para com as imagens de um corpo boiando num rio calmo, numa manhã qualquer.





A repentina tristeza que contrasta com a personalidade esfuziante de Yan Mija , sinalizada por suas coloridas e floridas vestes, desperta na personagem o interesse pela poesia , motivando-a a entrar em um curso técnico para aprender esta arte. Ali, Mija acaba encontrando mais do que almejava no ínicio. Ela acaba conhecendo um pouco mais de si mesma, suas fragilidades; seus medos e principios morais. Em determinado momento certo personagem diz: "Para escrever uma poesia é necessário vivê-la". Colocar emoções no papel é mais complexo do que se imagina , constata a protagonista. Não basta , por exemplo, observar uma árvore robusta , as àguas de um riacho ou a leve brisa do vento para entendê-los - é necessário sentí-los, absorvê-los na alma.




Os grandes méritos de Poesia se encontram na ótima sequência narrativa conduzida por Lee Chang-dong, que competentemente evita atropelos que poderiam comprometer o resultado final (por mais que lá pela metade alguns segredos sejam revelados, o interesse se mantém, permanecendo o espectador atento às reações da protagonista para com cada novo acontecimento), e no magnífico trabalho da veterana Yoon Jeong-hee. Seus embates com o velho de quem cuida e que a obriga a fazer algo inimaginável ( a cena dos dois na banheira é um duelo de lirismo e repúdio) e com a mãe que perdeu a filha são memoráveis. A atitude da atriz em se conter, eximindo-se do choro e expressões exageradas revelam que o diretor, juntamente com a intérprete , optou pela sutileza. É tudo muito leve, sem grandes alardeios. Camada a camada , cada elemento proposto soma-se ao outro perfeitamente, promovendo unicidade, confirmando o imenso talento de Chang-dong tanto na direção de atores quanto no texto.

Enfim, temos em Poesia algo pouco frequente hoje em dia: a preocupação de se contar uma boa história sendo colocada como o primeiro dos desafios.


Nota: 9

3 Response to "Poesia"

  1. Kamila says:

    Eu, às vezes, me sinto frustrada por não conseguir ter acesso à obras como essa, que você acaba de resenhar!

    Hugo says:

    Não conhecia o filme, fiquei curioso.

    Ótima dica.

    Estou linkando seu endereço no meu blog.

    Abraço

    Vi metade deste filme, ontem, num canal português. Metade, porque não consegui acompanhar desde o início. Mas gostei muito. É um filme harmonioso. Consegui perceber na protagonista muito de mim. Escrevi o nome "Yan Mija" na mão para no dia a seguir procurar na internet. Ainda está gravado na minha mão. Algumas cousas... marcam.

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